Vou tocar num assunto que eu ainda não tinha abordado nessa coluna até hoje. Uma das partes mais importantes de um jogo de futebol, mas que se acha, muitas vezes, mais importante do que realmente o é: o árbitro. O Kleiton havia postado um texto sobre eles naquela memorável semana em que invertemos os autores e suas respectivas sessões, mas ao assistir aos jogos deste final de semana alguns fatos me chamaram a atenção e eu quero compartilhar umas idéias com vocês.
Nossa própria cultura acaba superestimando esse papel. A gente costuma chama-lo de juíz, como se ele tivesse o poder para decidir tudo dentro do jogo. Muitos deles acreditam nessa máxima e a levam às últimas conseqüências. Se o árbitro decidir um jogo, é sinal de que ele não fez o que deveria fazer. Quem tem que decidir é o atacante! Ou, no máximo, o goleiro. Mas nunca a arbitragem. O àrbitro não está ali para julgar, mas para mediar uma partida.
Quem acompanha jogos da Europa e do Brasil percebe muito claramente a diferença entre os apitadores de lá e de cá. O futebol brasileiro é muito manhoso, beira à frescura mesmo. Qualquer esbarrãozinho de nada já é motivo para uma série acrobática digna de uma atração circense, seguida de uma interpretação de dor e sofrimento de encher os olhos. É, talvez a idéia de futebol-arte difundida em tempos passados tenha ganhado um caráter mais multimídia na era da globalização.
E a arbitragem contribui pra esse tipo de atitude fazendo o que chamam de "defender o craque". Na boa? Craque pra mim não é quem cava um penalti, mas quem se levanta de novo, rouba a bola do zagueiro e bota ela na rede! Tá muito chato acompanhar um jogo de campeonato brasileiro hoje em dia, a bola pára toda hora. Ontem no jogo Atletico-PR X Grêmio foi marcada uma falta sete segundos após o ponta-pé inicial, daí pra frente a minha impressão é de que não tivemos uma sequencia de bola em jogo muito maior que esse tempo.
A minha idéia original era banir esta figura do espetáculo pra ver se o campeonato volta a ser formado por espetáculos propriamente ditos, mas como futebol envolve uma competição, uma disputa entre dois adversários, é impossível que seja realizado sem um mediador; porque daí a disputa ficaria a dois passos de virar batalha e os adversários, de virarem inimigos. Então já me contentaria com uma correção de nomenclatura. Ao invés de juíz, mediador. E é assim que vou me referir aos homens do apito daqui pra frente.
Quando é que a gente decide começar a torcer por um time? Eu realmente não me lembro se houve um tempo em que eu era pessoa e não era gremista. O que eu sei é que hoje, depois de tanto tempo, eu já teria inúmeros motivos para entender o porquê de ser torcedor do Grêmio. E a cada motivo que esse time me dá eu abençôo aquela hora que eu não sei se existiu: a hora em que eu virei Tricolor. Costumo dizer que enquanto todos os outros clubes do Brasil estão distribuídos em um espectro onde brigam para ver quem é o melhor, o Grêmio não é melhor nem pior, o Grêmio é outra coisa. O Grêmio é original.
O primeiro jogo que eu assisti foi um Grêmio 3 x 0 Corinthians, no tempo em que o time tinha Paulo Egídio e Bonamigo. Era a tarde de um sábado do final dos anos 80 e eu estava assistindo sozinho ao jogo na TV do meu quarto quando, no finalzinho do segundo tempo, meu pai acorda de sua tradicional cesta e aparece na porta: “Quanto tá o jogo, filhão?”; eu respondi com a maior naturalidade do mundo que o Tricolor goleava. E ele foi tomado de um entusiasmo tamanho que eu, na minha sabedoria infantil, não entendia a surpresa dele. Afinal, que outro resultado seria possível em um jogo entre um campeão mundial e um sequer campeão brasileiro na época?
Claro que depois daquele episódio eu já aprendi um pouco mais sobre este esporte onde nem sempre a melhor equipe sai com a vitória e que, também por isso, é tão viciante. Aprendi também sobre esse time tão diferente, tão empolgante! Um time que tem por tradição buscar forças não se sabe de onde para reverter situações onde o gremista mais fanático já está sem esperanças. Um time que tem por tradição a alma castelhana, trazida a campo e incorporada pela sua torcida. Um time que tem por tradição, não ganhar sempre, mas ganhar quando é preciso. Um time que tem por tradição transformar cada título em épico, seja da segunda divisão ou da Libertadores de América. Um time que tem por tradição mostrar um futebol aguerrido, tão peculiar que faz os adversários muitas vezes renegar seu futebol. Um time que tem por tradição surpreender a desavisada imprensa que o chama de zebra a cada conquista. Enfim, um time que se eu fosse descrever com uma só palavra, esta seria TRADIÇÃO.
E quer mais tradição do que aniversariar na semana farroupilha? Parabéns, Grêmio Foot-ball Porto-alegrense. Se nos teus próximos 105 anos conquistares metade do que já possui, teu futuro já será imenso.
Esse final de semana teve clima de Copa do Mundo: as eliminatórias européias começando e rodada também na América do Sul. Em ambas, resultados parecidos. A Argentina penando pra empatar em pleno Monumental de Nuñes abarrotado contra o líder (!) Paraguai, que saiu na frente. A Venezuela, apesar de não ter ganhado nessa rodada, pela primeira vez na história ousa pensar numa classificação. Na Europa, essas eliminatórias começaram com a França perdendo merecidamente para a Áustria, a Itália decidindo o jogo no finalzinho contra o Chipre (relatos dão conta de que o goleiro italiano Buffon foi o nome do jogo) e a badalada campeã européia superando a Bósnia em casa pelo placar mínimo.
Será que a inusitada copa da Africa terá resultados surpreendentes? As casas de aposta pagarão menos a quem palpitar que a final seja disputada entre os vencedores de Chipre X Tunísia e Venezuela X Albânia?
Pra falar a verdade, eu duvido muito. Trazendo um pouco de história, a gente percebe que toda copa tem uma seleçao desconhecida que rouba a cena e aparece como sensação do torneio, mas na hora de decidir, de mostrar quem tem mais bala na agulha, quem tem mais pedigree, essas seleções acabam por sucumbir. E daí a gente vê que, pelo menos na Copa do Mundo, a primeira impressão não é a que fica.
Foi assim com Portugal em 66 e 40 anos depois, o Peru de 70, Camarões e Colômbia em 90, a Romênia e a Bulgária na sensacional Copa de 94, a Nigéria de 98, a Turquia de 2002. Todas elas grandes seleções (guardadas as proporções e levando em conta a diferença de qualidade entre as Copas que cada uma dessas equipes disputou) que sem dúvida fizeram por merecer o destaque que despertaram. E talvez elas não tenham sido eliminadas por falta de qualidade, mas sim muito mais por falta de preparo para segurar a barra de enfrentar seleções mais tradicionais.
Por piores que pareçam os times montados pelas grandes potências, elas acabam sempre prevalecendo, ainda que as vezes por motivos que nos são ocultos. Não é a toa que a última seleção estreante em uma final de Copa do Mundo foi a lendária Holanda de 74. E mesmo assim acabou perdendo!
Disso tudo eu tiro a conclusão que a graça de acompanhar uma Copa do Mundo é muito parecida com o entusiasmo de assistir a um bom filme: A gente sabe que o roteiro vai acabar sendo conduzido para a vitória do bem (ou, no caso, sempre a vitória do mesmo lado), mas acabam sendo criadas circunstâncias tão adversas que somos obrigados a tirar o chapéu para o diretor, que encontra uma forma de levar a história para o caminho esperado mesmo depois de deixar o espectador sem esperanças disso.
Os campeonatos europeus estão de volta. As temporadas de alguns países começaram há duas semanas. Não engrenaram ainda mas em bem pouco tempo já teremos a oportunidade de ver novamente em ação os melhores jogadores do mundo.
Ainda ontem, passando pelos canais me deparei com Shalke X Werder pela segunda rodada do campeonato alemão. Parei pra dar uma olhada, claro, afinal o futebol força jogado na terra do chucrute vire e mexe nos presenteia com um golaço, geralmente atraves de chutes fortes. Eu estava certo. Vi um golaço naquele jogo. Mas pra minha surpresa ele não foi composto apenas pelo chute forte, mas tambem por um drible desconsertante e um corta-luz. Isso mesmo! Parece que os caras gastaram todo o estoque de genialidade da temporada em um só lance.
Depois da pintura, o comentarista se achou no direito de defender o campeonato germânico: "O pessoal critica a falta de técnica do futebol alemão, mas a seleção é atual vice campeã da Europa enquanto o badalado futebol inglês nem disputou a Eurocopa.".
Por instinto, respondi (acho que em voz alta, até) a ele: "O badalado campeonato inglês não é disputado por ingleses!".
Daí vem a ideia da coluna. O campeonato inglês é hoje sem dúvida o melhor do mundo. Acabou aquela história de carrinho e bola aérea (nada contra, até acho que aquela essência deveria ser mantida.). Mas o fato se dá pela miscigenação experimentada atualmente. Se o cara é bom, vai pra lá. Não importa se é brasileiro, africano, australiano ou coreano. Os mais conservadores podem afirmar que seja essa descaracterização que tenha prejudicado o desempenho da seleção. Mas isso é fase, questão de adaptação.
Um fenômeno semelhante aconteceu na Espanha. No fim da década passada, era lá que se fazia o melhor campeonato, sobretudo por colaboração dos jogadores africanos. Barcelona e Real Madrid frequentando as finais da liga com a mesma intensidade que os tres grandes ingleses e o Chel$ea fazem hoje em dia, só a seleção espanhola é que não vingava.
Eis que na Copa de 98 eles tiveram a chance de mudar essa escrita montando uma boa seleção e caindo no grupo da Nigéria, entao campeã olímpica e maior ícone do futebol africano. Houve muita alfinetada por parte dos espanhois antes do jogo, diziam que os jogadores africanos prejudicavam o futebol praticado na Espanha e chegaram a ofende-los. O resultado da partida? Nigéria 3 a 2, com direito a frango do Zubizarreta.
Dez anos depois a Espanha é campeã européia. Claro que a geração atual é muito boa, me arrisco a dizer que é a melhor que ja montaram. Passaram à condição de exportadores de craques, coisa improvável tempos atrás. Mas eu acredito que um fator que tenha ajudado nesse desenvolvimento seja a liçao aprendida. Hoje me parece que os espanhóis não só sabem lidar com os jogadores estrangeiros como também tenham absorvido suas boas influências para a formação de um padrão de jogo superior ao que possuíam. O que faltava para conseguir um título que consagrasse o futebol espanhol como grande. É bem verdade que apenas uma conquista não quer dizer muito, vamos ver se minha tese é confirmada com uma sequencia de bons resultados.
Na semana passada as séries A e B do campeonato brasileiro (Brasileirão série A e Brasileirão série B, segundo as redes de televisão) estavam repletas de clássicos que agitaram torcidas nos estádios de todo o país. São Paulo X Palmeiras, Atlético X Cruzeiro, Flamengo X Vasco, Sport X Náutico, Fortaleza X Ceará, Avaí X Criciúma, Santo André X Corinthians...
Claro que o jogo mais comentado foi este último, que marcou o reencontro do Marcelinho Carioca, hoje astro da periferia do ABC paulista, com a Gaviões. Foi espetacular! Parecia até uma música dos Titãs dos anos 2000 (tipo "Isso" ou "Epitáfio") ou seja, tudo repleto de saudosismo. Uma espécie de reencontro de um casal decadente que se separou há algum tempo e que, agora, qualquer um pode falar para o outro: "Eu to mal, mas tu tá bem pior!".
Nem o Pé-de-anjo brilhou tanto quanto os ilustres narradores que nos presentearam com grandes pérolas ao longo das transmissões dessa semana. Fora as que me escaparam, separei algumas:
"O Paraná tenta sair do sufoco, mas o retrospecto não ajuda..." Sim! Se o retrospecto ajudasse, o Paraná não estaria no sufoco!
"O Denílson não é titular, mas ele jogou em todas as vezes que ele entrou em campo." Tá, tudo bem, eu vou perdoar essa porque a seleção de 2006 provou que dá pra entrar em campo e não jogar...
A melhor de todas foi esse diálogo: "- É, o jogador foi tocado... - Então você daria pênalti, Júnior? - é... bem... quem tem que dar pênalti é o juiz... - Porra, Júnior! (momentos de silêncio)" Não foi nada ofensivo, foi natural e espontâneo como chamar um grande amigo de filho da puta entre uma cerveja e outra.
Em alguns (tá bom, vários) posts aqui, deixei claro o meu desprezo pelo rumo que o futebol está tomando e como isso baixou o nível do esporte. No entanto, preciso dar o braço a torcer e reconhecer a quarta-feira passada como uma ode à tudo que nos empolga quando a bola está rolando.
Manchester United 1 (6) x (5) 1 Chelsea Uma final tipicamente inglesa. Empate em 1 a 1. Chata? Longe disso. Tirando as duas pauladas na trave que o Chelsea meteu, e as duas chances claríssimas perdidas pelo Manchester, o jogo ainda teve briga, confusões, tapas, socos, agressões, chuva torrencial e quase todos aqueles elementos que tornam uma partida inesquecível.
Já nos pênaltis, o drama atingiu níveis estratosféricos. Cristiano Ronaldo, o craque, o provável melhor do mundo, o carrasco que marcou o único gol dos Red Devils na partida, botafogueou e mandou a cobrança nas mãos do tcheco Cech. Tudo se encaminhava para o primeiro título dos Blues. Mas eis que, em um deslize, o herói do time John Terry - que salvou a equipe ao impedir um gol de Giggs na prorrogação - acerta a trave. Enquanto ele chorava feito um dirigente carioca, o brasileiro gremista Anderson correu alucinadamente para a bola e soltou um canudo no meio do gol, acertando a cobrança e realizando a melhor comemoração da noite. Kalou e Giggs converteram na sequência, mas então veio Anelka com ar blasé e fez os torcedores do Chelsea comerem o pão (francês) que o diabo amassou, chutando a pelota de forma displicente. O goleirão Van der Sar defendeu com facilidade e o tricampeonato foi para a terra do Oasis.
Fluminense 3 x 1 São Paulo Todo torcedor tem (ou pelo menos deveria ter) direito a, no mínimo, uma experiência de fé absoluta na vida. Aquele momento onde tudo ainda está na metade do caminho, nada é certo e alguns poucos segundos de indecisão possuem uma carga dramática do tamanho do universo. Aquele genial espaço de tempo entre a conformação e a comemoração com bebida em excesso e garotas mostrando os seios.
Não gosto do São Paulo. Não gosto do clube atravessar negociações e achar isso normal, não gosto de como superestimam o medíocre Rogério Ceni e, principalmente, não gosto da equipe paulista por ter permitido ao Inter ser campeão continental. Também não vou com a cara do Fluminense, mas o fato de jogar contra o São Paulo já tornou o tricolor carioca mais simpático, além de contar com o mestre absoluto do mundo, Renato Portaluppi, no comando.
Pois quando Thiago Neves cobrou o escanteio imediatamente identifiquei o momento de fé absoluta. Quarenta e sete do segundo tempo. A bola viajou em câmera lenta, enquanto os torcedores cariocas se angustiavam na agonia da incerteza. No momento em que Washington subiu e 70 mil pessoas inconscientemente repetiram seu movimento com a cabeça, estava decretada a classificação. Porque o destino também queria ver o Maracanã literalmente explodir.
Muito se falou sobre a hegemonia que o São Paulo vinha tendo, comprovada pelo bicampeonato e que gerou a alcunha de "O Lyon brasileiro" - referência à equipe francesa que desconhece o ideal de egalité e costuma vencer o campeonato nacional, deixando os outros times fazendo biquinho.
Nestes momentos, a instituição acaba se tornando exemplo de tudo: planejamento, organização, inteligência, economia, parceria e por aí vai. Convenientemente são esquecidos momentos como a eliminação na Libertadores 2006, 2007 e no Paulistinha 2008, pois eles não combinam com "esquadrões" de futebol. Em compensação, a cada gol feito o Rogério era adorado pela mídia e por torcedores como "o melhor goleiro do mundo", mesmo sendo o responsável direto pelo título continental dos colorados e pelo consequente quase-fim do mundo.
Pois bem. Depois de tanto blábláblá e puxação de saco em cima da equipe paulista, chegamos à pergunta que precisa ser feita mas ninguém tem coragem, a verdade nua e crua, a incerteza que agora paira sobre o Morumbi: pode o "excelente planejamento" (sic) resistir à derrota para uma equipe comandada por ninguém menos do que Celso Roth?
Ou foi um gigantesco acidente de percurso, ou chegou a hora de dizer aos sãopaulinos que por hoje é só, pessoal.
Parando pra pensar, talvez os registros estejam se tornando mais importantes do que os eventos - prova disso é o grande número de vídeos no YouTube identificando pessoas que pagaram uma nota para ver shows através das telas pequenas de suas máquinas digitais. Ou então a tentativa de espetacularizar ainda mais as transmissões/gravações de certos momentos através de recursos 'cinematográficos', como câmera lenta, closes em gestos, nuances, trilha, movimentos de câmera.
O vídeo com os 'melhores momentos' da Copa do Mundo de 2006 é muito superior ao que o torneio realmente foi. Posso afirmar isso com propriedade pois vi 53 das 64 partidas disputadas. É muito mais emocionante e empolgante. É o registro publicitário de uma Copa com poucas atrações, com poucas jogadas memoráveis, com poucos lances inesquecíveis. E se nem mesmo o espetacular gol da Argentina contra a Sérvia - um tango bem compassado que por si só poderia incluir todas as virtudes que pregam haver no esporte (união, trabalho em equipe, qualidade, inteligência) - entrou para os grandes momentos do campeonato, então talvez o futebol enquanto negócio esteja se tornando muito mais importante como recurso dramático do que qualquer outra coisa. Por isso tantos DVDs lançados, o Pedro Bial declamando poesia, novas câmeras e profissionais no campo: ilustrar os dramas ao invés de focar nos aspectos do jogo propriamente dito ajudam a manter a expressão "o esporte é como a vida".
Ou alguém acha que mostrar o U2 em um clipe oficial da Copa do Mundo tem alguma justificativa além de associar a imagem do futebol com a de uma banda de sucesso e, assim, com um produto espetacular?
Resultados e informações sobre torneios nacionais e internacionais:
CAMPEONATO GAÚCHO Juventude 1 x 0 Internacional O Sport Club até tentou catimbar exageradamente para sair de Caxias com um empatezinho - o que não é demérito, já que qualquer outro time pequeno teria feito o mesmo - , mas Fernandão, como bom craque que é, vestiu a touca do time e decidiu.
CAMPEONATO MINEIRO Cruzeiro 5 x 0 Atlético - MG Mais do que o Cruzeiro, o algoz do Atlético foi o fato de que este é o ano do centenário do clube - e todos sabem que, por lei, uma equipe precisa fazer pelo menos um fiasco na temporada em que completa 100 anos.
CAMPEONATO PAULISTA Ponte Preta 0 x 1 Palmeiras O baixinho Kléber usou a cabeça e colocou o verdão na frente nessa disputa, mas a Ponte não quer ver tudo por água abaixo e vai estar com a macaca no Parque Antártica. O bom é que, caso o Palmeiras realmente seja campeão, o uísque 12 anos estará no ponto para a comemoração.
CAMPEONATO CARIOCA Flamengo 1 x 0 Botafogo A Estrela Solitária, pra variar, entrou em campo vestindo amarelo. Obina marcou o único gol da partida, deixando os flamenguistas perto de ter um título para comemorar e a mídia de ter um motivo a mais para falar da equipe. Ainda bem que o Fenerbahçe não avançou na UCL, pois o combo "campeão carioca + Zico, o Flamengo na Europa" seria difícil de aturar.
CAMPEONATO PARANAENSE Coritiba 2 x 0 Atlético - PR O Coxa venceu e está com a mão na taça, mas o CAP não vai cruzar os braços porque está de cabeça nessa disputa, e pretende quebrar as pernas do Coritiba no jogo de volta. É bom o time do técnico Dorival Jr. ficar de olho.
CAMPEONATO CATARINENSE Figueirense 1 x 0 Criciúma O Figueirense precisa de pelo menos um empate. O Criciúma, de no mínimo 1 a 0 pra levar pra prorrogação. Nesse meio tempo, as equipes treinam com afinco em praias e lugares paradisíacos, que se opõe completamente ao futebol apresentado pelos dois times.
LIGA DOS CAMPEÕES DA EUROPA Barcelona 0 x 0 Manchester United Ao contrário de Obina, Eto'o passou em branco. Os unidos de Manchester entraram dispostos a praticar o mais vistoso e clássico futebol inglês, ou seja, foram ao Camp Nou para não jogar, guardando a decisão para a volta em Old Trafford. Visto que os Red Devils ainda não perderam para o Internacional na sua história, eles levam vantagem.
Liverpool 1 x 1 Chelsea Um clássico britânico. Na volta, aposto num empate em -2 a -2, com o Liverpool passando à final após dezoito cobranças de pênalti, e realizando uma comemoração avassaladora no chá das cinco.
Futebol é uma coisa simples: 22 jogadores em campo precisam fazer a bola cruzar a linha de fundo, dentro de um espaço determinado por duas traves e um travessão. O gol é a celebração máxima do esporte porque ele é a definição desse objetivo. É o momento crucial, o resultado de uma construção metódica ou caótica que buscou sempre essa finalidade. E muitos jogadores aprenderam esse conceito ao longo da carreira, tornando-se exímios atacantes que, na primeira oportunidade, (re)descobrem a rede
Um deles, entretanto, pareceu nascer com tal objetivo pronto, como se os segredos da área fossem um livro aberto à sua frente. Durante 20 anos, Romário foi o especialista em definir e decidir. Jamais tomei conhecimento de outro centroavante com tamanha desenvoltura, precisão, criatividade, inspiração e outros adjetivos que enaltecem o craque (no melhor sentido da palavra, e não no que é usado hoje em dia). A gestação de seus gols era caótica, pois de Romário saíam jogadas sobrenaturais - entretanto, assim como há ordem no caos, a lógica da bola era a de sempre procurar os pés do baixinho. E de lá para o fundo das redes.
Desconfio que o artilheiro, ao invés de nascer, tenha sido plantado e cultivado em algum campo de futebol. É a única explicação possível. Quer dizer, de que outra forma a ciência justificaria um cara de um metro e sessenta e nove cabecear livremente entre os muros da defesa sueca, na semifinal da Copa de 94? Depois dessa, Romário tem todo o direito de virar pra Isaac Newton e dizer "chuuuuuuuuuuuuuuuuuuuupa". Que outro centroavante pode debochar das leis da física?
A verdade é que ele pertence à região da grande área, faz parte dela. Um não é completo sem o outro. E agora que Romário de Souza Farias se aposentou de fato (é o que parece, pelo menos), há um buraco nos campos de futebol do mundo todo. Porque "gol" e "Romário" são palavras indissociáveis. São a mesma coisa. São o ponto alto do espetáculo.
O Liverpool tem Lucas na reserva. O Manchester United tem Anderson de pseudo-titular. O Barcelona tem Ronaldinho, agora de férias até o final da temporada, mas que mesmo antes da contusão já vinha sendo escalado pra marcar o quarto árbitro. O Chelsea tem Beletti e Alex, ambos também aproveitando as confortáveis poltronas da casamata.
Ok, vamos dar um desconto e considerar o rastafari ex-gremista como titular dos Unidos de Manchester. Isso faz com que, dos quatro semifinalistas da Liga dos Campeões da UEFA, apenas um tenha um brasileiro como parte integrante e funcional do time. Os outros podem até vir a ser titulares no futuro, claro, e têm potencial para isso, mas a grande verdade é que no momento os narradores e torcedores ufanistas não possuem muito do que se gabar.
Subverteu-se então aquele clichê de que "os melhores times da Europa contam com brasileiros nas principais posições", irritante frase que tentava inflar ainda mais o ego do futebol nacional. Não que nossos compatriotas mais afortunados tenham sido sempre coadjuvantes, não é isso. Mas na temporada passada, por exemplo, Seedorf foi essencial no título da UCL - não tanto quanto Kaká, claro, mas a participação dele e de outros "estrangeiros" é relevada a segundo plano pela mídia nacional.
Robinho, Kaká, Pato, Alex, Zico, e em menor escala Mancini... todos eliminados pelos "quadrados" europeus. Sei que o futebol daqui é o melhor e sei que a capacidade de renovação dele é simplesmente absurda, mas que dá um gostinho bom ver os times "que só jogam com chuveirinho na área" passando por cima da ginga e malandragem brasileiras, ah, isso é. Botam o (futebol) moleque pra jogar com os adultos, dá nisso: a molecada toda foi pro quarto sem sobremesa.
A tentativa de transformar o futebol em um negócio, na conotação mais pejorativa possível da palavra, trouxe uma série de situações ridículas para o esporte mais popular do mundo - sendo, claro, a maior delas a idealização de um campeonato sem final (mas isso é história pra outro post). A visão da coisa toda enquanto um mercado traz à tona a necessidade de tratar jogos como resultados, ou seja, objetivar tudo aquilo que acontece em campo, ou seja, traduzir em números a produção de determinado time e/ou jogador. Ou seja, estatísticas.
Não que eu seja contra elas, não é isso. Acho que são interessantes complementos para uma partida, mas por favor, que parem com essa mania de achar que a realidade de um esporte tão subjetivo e imprevisível pode ser traduzida perfeitamente em números. É triste ouvir dos jornalistas coisas do tipo "o Grêmio jamais venceu o Santos em um jogo de volta pelo Copa do Brasil por uma diferença maior do que três gols sendo dois de cabeça e um de pênalti". Ou então aqueles "a Ucrânia tenta quebrar um tabu, pois não vence o Brasil há sessenta anos! Foram dois jogos com vitória da seleção canarinho". A tentativa de sensacionalizar o jogo acaba transformando a cobertura em algo patético.
Sem contar o seguinte: o Meia dribla dois e faz um lançamento sensacional pro Atacante 1. O Atacante 1 dá um passe simples pro atacante 2, que faz o gol. Quem ganha uma assistência? O Atacante 1. O Meia ganha apenas um passe certo que, no geral, dá no mesmo que aquele "passe Zé Roberto" (de 2 metros, pro lado e que não contribui em nada com a jogada). E se o Volante 1 tem mais desarmes, como contabilizar as vezes em que o Volante 2 fechou os espaços, impediu o avanço dos laterais, cercou o adversário? Não dá.
Claro que é muito legal ver ali o número de faltas (e quantas dessas foram realmente faltas?), escanteios, chutes a gol, triangulaçoes... Mas, como eu falei, esses dados são apenas curiosidades e não podem ser tratados como a realidade do jogo. Que me desculpem os cartolas, jornalistas, empresários e dirigentes, mas os únicos números que realmente importam são os do placar. O resto é doce imprevisibilidade.
Assistindo as transmissões de futebol pela televisão de hoje em dia eu sempre chego à conclusão de que qualquer eu pode ser comentarista. É a coisa mais fácil do mundo, basta um pouco de atenção e meia dúzia de frases prontas. Falando nisso, em breve nesta coluna não percam o manual do comentarista de futebol da TV.
Uma coisa que melhoraria muito a minha visão a respeito desse pessoal seria o abandono da pseudo-neutralidade que eles tentam passar. A gente sabe, fica claro que determinado narrador está torcendo para um time durante a transmissão, mas os caras insistem em negar isso.
Essa imparcialidade parcial tem que acabar! Imaginem que divertida seria a narração que fosse feita sem a preocupação de tentar esconder a paixão que o narrador certamente sente: "Bucha! Gol do meu time! Chuuuuuuuuuupa!''.
O Luciano do Vale, da Band, que é torcedor declarado da nada comprometedora Ponte Preta, disse certa vez que é muito mais gostoso narrar jogo da Seleção porque ele não precisa ficar se contendo e pode botar mais emoção nos seus comentários. Pra quê isso? Grita gol da Ponte Preta do jeito que tu tem vontade!
Outro dia, inclusive, dei muita risada quando um dos narradores da Globo se confundiu e chamou o Flamengo de Brasil.
A inspiração pra este post me veio nesse domingo de manhã, enquanto eu assistia ao Grandes Momentos do Futebol na TV Cultura. Eles mostraram os gols de um Flamengo 3 x 1 Vasco no tempo do Zico. Não foi mencionado o nome do narrador e eu também não consegui identificar, mas todos deviam seguir o exemplo do cara. Primeiro gol do Flamengo: indignado, se calou esperando a grande maioria flamenguista dos 175mil torcedores parar com o alvoroço para no fim disparar um "Não é possível! Menos de um minuto?" (O rubro-negro abrira o placar com 27 segundos de jogo.). E no terceiro: a mesma reação e um desanimado "pois é... 3 a 0...". Quando o Vasco diminuiu ele soltou um urro que parecia que o Vasco tinha feito um gol de título de Libertadores!
O telespectador repara no comportamento da equipe de jornalismo, sabe que puxam o saco de certos times. Se esse partidarismo fosse exposto abertamente e sem falsidade, talvez seria menos antipático da parte deles. Eu, pelo menos, diria: Quer torcer pro Curintia? Azar o dele!
Mario Puzzo deve estar feliz onde estiver sabendo que a tradição da máfia italiana continua viva até os dias de hoje. Seculo XXI, era da informação e do fácil acesso, onde teoricamente nada pode ser feito por ''debaixo dos panos'' e ficar oculto por tanto tempo.
Um levantamento da imprensa esportiva da Italia (não tenho a fonte exata, eu soube da informação atraves da transmissao da band deste domingo) mostra que se todos os erros de arbitragem fossem corrigidos; gols mal anulados contabilizados e vice-versa, a classificação do certame da serie A seria bem diferente.
Oficialmente, os tres primeiros colocados, pela ordem, são: Inter 56pts; Roma 48pts; Juventus 44pts. A classificação corrigida traz: Juventus 54pts; Roma 52pts; Inter 48pts.
Claro que é muito dificil comprovar um beneficiamento premeditado ao atual "Bi-campeão" do scudetto. Afinal de contas, um escândalo dessa magnitude só é descoberto se algum esquema de força maior é posto em xeque devido a ele. Vide caso Edilson no brasileirão 2005...
Mas o caso é que justamente a Vecchia Signora, que tem a carinhosa alcunha em alusão a beneficiamentos históricos que recebeu no passado - uma espécie de poderosa chefona do calccio - , é a mais prejudicada atualmente, ja tendo perdido a liderança e 10 pontos em 22 rodadas devido aos equívocos de arbitragem que vêm ocorrendo na Itália.
Mudando de assunto, mas ainda com sotaque macarrônico, vale aqui um registro sobre a partida entre Milan x Siena que eu acompanhei na hora do almoço. Com Pato e Kaká machucados, a squadra rusonera estava fadada a mais um tropeço no San Siro. Até que o técnico Carlo Bunda-pra-lua Ancelotti promoveu a estréia de mais um garoto de 18 anos entre os profissionais.
O atacante italiano Paloschi entrou no lugar do ala veterano Serginho mudando a formação do time e, no primeiro toque na bola de sua carreira em um jogo oficial, estufou a rede e definiu a vitoria de seu time. Acho que nem nos devaneios mais lúdicos, alguém que tenha sonhado em ser um jogador de futebol pôde imaginar uma estréia tão perfeita quanto a desse garoto. Literalmente com o Pé-direito.
Crescer é enfrentar a realidade. Descobrir que Papai Noel não existe, que ter barba não é exatamente algo prático e que as meninas não se interessam por bonecos dos Comandos em Ação. No entanto, certos momentos que vivenciamos quando crianças ainda mantém a mesma atmosfera impressionante e idealizada (leia-se "saudosismo") - não é a toa que, a partir de certa idade, as pessoas querem rever os desenhos que assistiam quando eram mais jovens (e que foram abolidos do cotidiano adolescente por questões sociais).
Entre junho e julho de 1994, eu descobri que existia um país chamado Romênia (dêem um desconto, naquela época Google e Internet não existiam). E descobri graças à seleção romena, que na Copa do Mundo dos Estados Unidos construiu uma trajetória brilhante até as quartas-de-final, sendo eliminada pela Suécia nos penaltis.
Naquela época, o número dez definia não apenas a minha idade, mas também o craque de cada time: os setes, noves, onzes, por melhor que jogassem, eram coadjuvantes (Romário é a exceção que confirma a regra). E na Romênia, o jogador que carregava tal fardo o fazia como se fosse a coisa mais leve do mundo, um trabalho simples. Para ele, o dez era um estímulo, e não um peso.
A grande verdade é que cada toque que Gheorghe Hagi dava com o pé esquerdo na bola tinha algo de surreal. Parecia que o próprio objeto procurava os espaços, encontrando a melhor forma de transitar pelo campo. Ao longo do torneio, ele comandou o time: não apenas era o capitão, como o líder técnico da equipe. Dava lançamentos, fazia gols, abria espaços... Foram cinco partidas, superando equipes como as favoritas Colômbia e Argentina. Em todas, o número dez da Romênia esbanjou categoria e técnica.
Até hoje, quando falam como o futebol encanta e como ele pode se tornar deslumbrante, eu não penso em Pelé, Ronaldinho, Zidane, Ronaldo... O primeiro que me vem à cabeça é Gheorghe Hagi. Vocês podem até questionar, apontando que muitos outros jogadores tiveram carreiras mais regulares e bem sucedidas - além do mais, quando Hagi colocou grandes jogadores a seus pés eu tinha apenas dez anos. Então talvez as coisas nem tenham sido tão impressionantes como coloquei aqui, talvez este post seja apenas a idealização de um jogador que vi atuar e gostei. Mas, nostalgia ou não, é difícil analisar racionalmente uma situação quando se é criança e o número dez de uma seleção desconhecida encobre o goleiro com uma facilidade quase inacreditável. A cinquenta metros de distância.
E foi a estréia. Não posso aqui analisar a atuação do seu primeiro jogo, pois vi apenas os melhores momentos, mas Alexandre Pato parece ter feito uma boa partida. Nem ruim, nem ótima, nem heróica, nem péssima. Fez um belo gol, mostrando habilidade e inteligência, e errou dois frente à frente com o goleiro, completamente livre. Ansiedade pela estréia, talvez.
O que realmente eu não entendo, que pra mim não faz sentido mesmo, é esse deslumbramento da mídia gaúcha com o piá. Sinceramente, não saquei. Por que tentar desesperadamente tornar o guri um ídolo dos gaúchos? Nem ídolo dos colorados ele é, imagino, já que não fez nada muito relevante no Sport Club. Pato foi o destaque do caderno de esportes da Zero Hora, com a manchete "O Dono do Show". Em entrevistas com personagens do futebol nacional (Felipão, Zagallo), os "jornalistas" fazem perguntas que começam dizendo "os gaúchos querem Pato na seleção". E querem?
Talvez a imprensa do Rio Grande do Sul, em todo seu bairrismo irritante, esteja querendo criar o novo Ronaldinho, para as pessoas mandarem e-mails dizendo que o melhor jogador do mundo é gaúcho, a melhor atleta de ginastica é gaúcha, a melhor modelo é gaúcha... Nesse caso, o Pato seria uma oportunidade para propagandear e alardear ainda mais esse regionalismo. É a única explicação para idolatrar um garoto que nasceu no Paraná e não tem absolutamente nenhuma identificação com os gaúchos. Não há nenhum resquício de jornalismo nessa glorificação que a mídia faz. Não há nenhum mérito do Pato em receber esse puxa-saquismo.
Acima de tudo, não há nenhum compromisso por parte de um veículo que, embora ressalte o gol que um novato fez em um jogo do Milan, apenas cita os 6 a 0 que o Manchester United aplicou no Newcastle. Nenhuma palavra sobre um gaúcho, natural de Porto Alegre, que vem se destacando bastante nos jogos da equipe inglesa e assumiu a titularidade. Nem sequer uma linha sobre suas belas atuações.
Felizmente, o futebol vai além das mesas redondas na TV e dos comentaristas nos jornais. Enquanto a imprensa está deslumbrada inventando a "patomania", enquanto o jogo do Milan recebe mais cobertura por causa da estréia do guri, enquanto previsões são feitas a respeito do novo "craque", Anderson vai conquistando cada vez mais seu lugar no meio-de-campo dos Red Devils. Ainda bem que ídolos são feitos de nomes, e não de manchetes.
Quando eu ainda trabalhava, eu passava dez horas dentro da agência. Somando-se a isso o tempo de ida e volta de ônibus, o total ficava em cerca de onze horas e meia/doze horas fora de casa - isso sem contar, claro, os dias que eu ia à academia.
Ainda assim, entre junho e julho de 2006, eu assisti 53 dos 64 jogos da Copa do Mundo (sendo que oito foram jogados simultaneamente, ou seja, na prática perdi apenas três partidas). Como? Eu assistia alguns no meu horário de almoço, outros eu gravava pra ver quando chegasse em casa... evitava olhar qualquer noticiário ou entrar em qualquer site de notícias pra poder desfrutar dos jogos sem saber o resultado. Pra poder torcer.
Não há explicação lógica para tal atitude. Eu poderia até falar aqui sobre a relevância social do futebol - e é idiotice dizer que isso não existe, uma vez que o esporte se tornou um negócio multibilionário, interferindo em diversos aspectos da sociedade -, mas não é isso. Poderia falar que, enquanto publicitário, preciso estar atento às questões em destaque na mídia, mas não é isso. Poderia até dizer que sou fã de esportes em geral, mas não é isso.
A grande verdade é que não escolhemos por quem vamos nos apaixonar. Simplesmente acontece. Da mesma forma, desde pequeno fui fisgado de forma irrecuperável por uma bola de futebol. Por que é simples: em dois tempos de quarenta e cinco minutos, tudo que um time precisa é fazer a pelota atravessar uma linha. E é dessa simplicidade que se originam as obras de arte com passes harmoniosos, jogadas que são uma pintura, gols cinematográficos. É dessa simplicidade que se originam as estratégias romanas, a força de vontade espartana, as decisões em milésimos de segundo que mudarão vidas. É dessa simplicidade que se originam heróis, craques, gênios, lendas.
É dessa simplicidade que vem aquele arrepio na espinha, que sobe até os olhos encherem de lágrimas, libertados por um grito de alívio que almeja alcançar o infinito.
Por isso, toda vez que vou tentar definir o que é o futebol, e o quanto ele significa, eu acabo falhando. Não por falta de capacidade, mas porque, no final das contas, é o futebol que me define.
Renato e Alice eram pessoas casadas normais. Viviam suas vidas normalmente, faziam compras como pessoas normais, iam a shows de pessoas normais e, como todas as pessoas normais, tentavam não parecer normais.
Um dia, tiveram a oportunidade de sair daquela "normalidade". Depois de muita dedicação no trabalho, Renato ganhou uma passagem e estadia em Tóquio por alguns dias, com tudo pago. O problema é que Alice precisava ficar no Brasil para trabalhar. Combinaram, então, que Renato iria sozinho, que aproveitaria ao máximo a viagem e que traria pelo menos dois presentes pra esposa.
Ao pisar em solo japonês, ele se maravilhou com a cidade. Todas aquelas luzes, aquela cultura completamente diferente. Tudo era muito novo, e ele sentiu que tinha muito ainda a descobrir. Dando voltas a pé pela cidade, ficava maravilhado com as tecnologias disponíveis, apesar de se sentir meio perdido, pois não sabia falar japonês e ainda não havia se acostumado com a mudança de fuso horário.
No seu segundo dia lá, estava descendo uma rua quando parou pra olhar a vitrine de uma loja da Toyota. Seu interesse era apenas momentâneo, e já estava pra sair quando algo lhe chamou a atenção: junto ao carro mais bonito, tinha uma modelo, daquelas que ficam sorrindo pra chamar ainda mais a atenção pro produto principal. Renato nunca havia visto mulher mais linda: ela vestia uma saia de colegial, e o menor top que Renato vira na sua vida. Possuía pernas compridas, bem delineadas. Seus seios eram firmes, tenros, apontando sempre para a frente. Possuía um corpo espetacular, nem muito magra, nem muito gorda, com curvas sensuais onde qualquer piloto gostaria de derrapar, e um rosto belíssimo, angelical, com fios de cabelo caindo sobre os olhos puxados, passando pelo nariz delineado e chegando na boca carnuda. Em suma, uma mulher esculpida por Michelangelo e pintada por DaVinci.
Porém, havia algo que Renato realmente não conseguia acreditar: ela estava olhando pra ele. Uma mulher daquelas, que podia ter quem quisesse, estava olhando pra ele, Renato, um cara que saía pela primeira vez da América Latina e ainda não conhecia nada da cultura local. Mas era isso mesmo, ela não apenas o estava encarando como o chamou para entrar na loja. Renato limpou a baba do casaco e entrou. Meio hesitante, fingia que olhava os carros, mas foi na direção dela. A mulher o encarava, e ele não conseguia nem devolver o olhar. Chegou perto dela e, de cabeça abaixada, soltou o "Hi.." mais abafado da história da língua inglesa.
Ela falava inglês. Disse que seu nome era Sayuri. Não disse mais nada. Apenas entregou um papel a Renato, com que tinha o nome de um bar e um horário, meia-noite. Depois disso, virou o rosto e não deu mais atenção a ele.
Renato chegou um pouco atrasado no bar, a meia-noite e quinze. Sabia que estava fazendo algo errado, não esquecera que tinha uma esposa no Brasil, mas aquela japonesa não saía de sua cabeça.
Ao entrar, logo viu ela. Mas havia algo errado. Tinha um cara conversando com ela, com pinta de ser alemão. Renato se aproximou, e viu que, apesar das investidas, ela não queria mais conversar com o alemão. Renato interviu, mas o homem se irritou, dizendo que era de Hamburgo e que lá quem chegasse primeiro era quem ficava com a mulher. Renato então acertou o rosto do alemão com uma direita poderosa, mas logo sofreu o revide. Meio cambaleante, acertou um gancho no rosto do alemão, que voou pra cima do balcão, quebrando todos os copos e garrafas. Rapidamente, Renato e Sayuri saíram dali. Ela o convidou pra ir a seu apartamento. Disse que iria cuidar dos machucados dele.
O que se passou nas duas horas seguintes, Renato não esqueceu. Não poderia, mesmo que quisesse. E não queria, mesmo que pudesse. Fez sexo com Sayuri de uma maneira que nunca havia imaginado antes. Ela conhecia todos os movimentos, todas as técnicas, todos os segredos. Renato se deliciava passando a mão naquele corpo escultural. Nunca havia tido uma experiência igual. Nuca havia tido uma experiência nem mesmo remotamente semelhante. Sentiu como se tivesse ido ao espaço e voltado. Naquele momento, sentiu-se poderoso. O mundo era dele.
Ao voltar ao Brasil, Alice o recepcionou no aeroporto. Estranhamente, não sentia culpa nenhuma, apenas uma certa melancolia por saber que Sayuri agora iria atrás de outros homens, que fossem geograficamente mais acessíveis.
Assim, voltaram à normalidade nos doze anos subseqüentes (exceto por uma briga que tiveram, que acabou jogando Renato nos braços de uma morena feinha, uma mulher de segunda mão, mas que foi resolvida). Mas o destino ainda estava pra pregar uma peça nele.
Alice conseguiu também uma passagem pra Tóquio, doze anos depois daquela noite maravilhosa que Renato teve. Dessa vez, foram os dois, mas como a viagem de Alice era a negócios, Renato teria muito tempo pra circular sozinho pela cidade. E foi o que fez. Passou o tempo inteiro procurando Sayuri. Foi à loja da Toyota, mas ela já tinha saído e só voltaria no outro dia. Procurou ela por toda parte, por todos os cantos da ainda mais iluminada Tóquio. Aliás, eram tantas luzes, neons e coisas do gênero que Renato sentiu-se tonto. Sentou-se num banco em frente a um estádio de futebol, pra relaxar. Respirou fundo, tomou um pouco de água e, ao levantar o olhar, não acreditou no que viu: Sayuri estava ali, na sua frente, tão linda e escultural quanto estava doze anos antes.
Dessa vez, não perdeu tempo e foi direto falar com ela. Ela se lembrava dele, e deram caminhadas agradáveis por um parque que tinha ali perto. No entanto, ao começar a dar investidas, o mundo de Renato caiu: ela estava namorando um holandês. Depois de todo aquele trabalho, todo aquele tempo, ele não conseguiria beijar aqueles lábios carnudos, nem passar a mão naqueles cabelos macios. A exaltação inicial deu lugar à mesma melancolia que teve ao desembarcar no Brasil doze anos antes. Conversaram por mais um tempo. Ela lhe deu o número de seu telefone no Japão pra ele, mas logo depois disse que precisava ir pra encontrar o holandês. Renato ficou abatido, inconsolável.
Ao voltarem pro Brasil, a tal "normalidade" não foi atingida de novo. Renato sempre pensava em Sayuri. Onde quer que fosse, procurava uma maneira de tentar ir até ela de novo. Não dava valor ao que não pudesse ter alguma ligação com ela. Foi então que Alice, irritada, terminou tudo. Não queria mais viver assim. A tristeza levou Renato a voltar para os braços da mesma morena de segunda que o acolheu da outra vez. Porém, decidiu não desistir. Decidiu que iria reconquistar Alice. Sayuri saiu então de sua cabeça, e, ao longo dos últimos seis meses, ele tem tentado incessantemente reconquistar Alice.
E é aí que ele está errado. Mesmo que volte a reconquistar Alice, nunca será plenamente feliz com ela. Não depois daquela noite em Tóquio. Não depois de ter corrido no corpo macio, quente, adorável de Sayuri. Essa busca de Renato o levará a anos de uma vida "normal", de uma vida que não é mais o suficiente pra ele.
Renato só precisa fazer uma coisa. De alguma maneira, tem que voltar a Tóquio e conquistar Sayuri de novo. Depois dela, nenhuma será tão boa, nem tão relevante. Pois Renato jamais irá se esquecer daquela note memorável, daquela noite onde as horas diluíram-se em minutos de prazer puro. Daquela noite onde ele teve a melhor sensação de sua vida, algo que ele não chegou perto de alcançar mais uma vez. De como Sayuri fez parecer que ele, de alguma forma, estava no espaço, com estrelas a sua volta, com o sol quente o aquecendo, com a lua embelezando tudo.
Não, ele nunca esquecerá aquela noite em que ele foi o dono do mundo. E, lá do topo, ele pôde se virar pra baixo e gritar, com todo o ar em seus pulmões, gritar para o planeta inteiro ouvir: "A TERRA É AZUL!"
Antes de tudo, quero me livrar do peso de fazer qualquer tipo de relação com a obra de Dostoievski. Não a li. Mas é que os acontecimentos futebolísticos do final de semana me remeteram diretamente a esse título. Crime e Castigo, ou mais popular, Aqui se faz, aqui se paga.
O Corinthians foi rebaixado! E a menos que você seja um corintiano, deve estar sorrindo com isso. Não se trata de perseguição gratuita. As pessoas não gostam mesmo do clube paulista. E isso se deve muito pela superexposição na mídia.
Esse time nunca foi muito alem de campeonatos brasileiros, ganhou alguns campeonatos paulistas e é o único time sul americano campeão do mundo que nunca conquistou a Libertadores. Ou melhor, campeão do mundo não, campeão FIFA.
Conseguiu reunir a segunda maior torcida do Brasil (?) talvez por um fato bem simples: brasileiro é um povo que gosta de sofrer. Como diz o final da letra do seu hino, o clube mais brasileiro.
Na realidade, o clube mais odiado pelos brasileiros. E não é um ódio motivado por inveja como no caso de seu rival São Paulo, por que o Corinthians não coleciona feitos de que possa se orgulhar. A principal glória de sua história foi quebrar um jejum de mais de década sem ganhar nem campeonato de par ou impar, quando derrotou a Ponte Preta por 1 a 0 no Paulistão de 77.
Eu ia dizer agora que é um time que nunca fez mal pra ninguém, mas não posso deixar de citar o título mais injusto e desqualificado da história do futebol. Sinceramente, se eu fosse corintiano, não sei se comemoraria o titulo brasileiro de 2005.
Mesmo assim, tudo que o Corinthians faz é grandioso. Digno de coberturas minuciosas por parte da imprensa. Até o meu Word entrou nessa onda de puxa-saquismo exagerado agora: acabei de escrever Corinthians com C minúsculo e o petulante me corrigiu. Aposto que a mídia vai continuar tratando eles dessa forma também: o Timão vai continuar sendo maiúsculo na serie B, serie B com B maiúsculo!
Por toda essa supervalorização inexplicável, fenômenos até então impensáveis, como gremistas e colorados lado a lado comemorando numa tarde em que nenhum de seus times venceu, aconteceram quando o Corinthians foi castigado pelos seus crimes.
Há dois anos, minha noção de possível se ampliou exponencialmente. Há dois anos, meu conceito de épico se concretizou definitivamente. Há dois anos, gritei mais alto do que nunca. Com todas as letras, por um tempo incalculável. GOL DO GRÊMIO. Um feliz Dia Oficial da Raça Gremista a todos.