Percorreu os olhos pela tela branca, que zombava dele, insistia em arrefecer qualquer faísca de criatividade. Levantou-se da cadeira. Caminhou em círculos pela sala, e teria parado, caso percebesse que estava fazendo um clichê tão grande quanto os que evitava colocar na tela. Chutou uma bola de futebol contra a parede por algumas vezes, tentando botar em ordem seus pensamentos, pois a inspiração costuma se enamorar do prosaico, e voltou a se sentar. Batia nas teclas como alguém marreta uma pilha de pedras, sem paixão, apenas como exercício de vida, e via nascer em seu monitor apenas um conjunto de palavras cuja ligação entre si era tão tênue quanto aquela que mantém os homens de má índole conectados ao mundo. Perscrutava sua mente atrás de associações ou conexões ou ligações ou insights que acionassem seu sistema de criação. Bebeu mais um gole do refrigerante gelado ao seu lado, compilou informações que tinha na cabeça, organizou-as, desdobrou-as, enfrentou-as, obrigou-se a encontrar algum gatilho de imaginação, mas novamente foi frustrado frente aos resultados. Deixou-se levar pela inércia que teima em se apresentar nos momentos mais inoportunos, e ficou ali por um par de horas, ou de dias, não sabia ao certo. Até o momento em que a situação ficou insustentável, insuportável, e ele começou a digitar determinado, sem hesitar, o início do novo texto, que buscara o tempo todo, e não se importava mais se era bom ou não, apenas se estava ali ou não, e as primeiras palavras começaram a aparecer no monitor: "Percorreu os olhos pela tela branca...". |