O Processo, Franz Kafka (Der Prozess, 1925). Abril, 1979, 277 páginas.
Alguém devia ter caluniado a Josef K., pois sem que ele tivesse feito qualquer mal foi detido certa manhã.
Assim como em A Metamorfose, Kafka praticamente resume a obra inteira na primeira frase de seu livro. Josef K., um respeitado banqueiro, certa manhã é detido na própria pensão onde habitava. Fica sabendo que corre contra ele um processo, cujo teor K. desconhece, e descobrimos, no decorrer da obra, que nenhuma acusação contra ele virá à tona.
Crítica ferrenha ao aparelho judiciário e à corrupção dos funcionários da justiça, a acusação contra Josef K. é o tempo todo um mistério. O interrogatório em que K., no afã de resolver logo a situação, impede que lhe seja dirigida qualquer pergunta; o encontro com o pintor bem relacionado, cujos contatos dão a K. a esperança de uma resolução positiva de seu processo; as reuniões com o advogado que K. considera pouco compromissado com seu caso. Cada acontecimento no livro, ao contrário do que gostaríamos, não esclarece a situação do protagonista – antes, vão tornando-a uma teia complexa onde tanto o leitor quanto K. encontram-se irreversivelmente enredados.
A narrativa construída por Kafka é tão burocrática (pesada, prolixa, como queiram chamar) quanto a justiça que Josef K. tenta combater. Apesar disso, Kafka consegue criar uma empatia tão grande com seu protagonista que a certa altura, sem nem perceber, começamos a esquecer o absurdo de sua situação para nos preocuparmos com o desenrolar de seu processo – mesmo sem sabermos uma vírgula sequer do seu conteúdo. K. e o leitor compartilham da mesma ignorância acerca dos procedimentos judiciários, da situação do processo e das possíveis soluções para o seu caso. E ao final, mesmo após todos os esforços empenhados por K., ambos (protagonista e leitor) descobrirão que tais esforços foram em vão.
Baita livro, embora exija uma boa dose de vontade para chegar ao final. Recomendo.Marcadores: dando a letra |