Parece que o grande denominador comum no surgimento de alguma nova tecnologia é o anúncio da imediata extinção da tecnologia anterior, como se o progresso fosse uma série de relacionamentos amorosos onde precisamos nos desligar do outro para aceitar o novo, isto é, um cenário bizarro onde a tecnologia aparentemente nos traiu enquanto estávamos no trabalho ou qualquer trauma assim e agora é necessário superar isso para aceitar o novo relacionamento ("existem muitos peixes com chips e placas eletrônicas no mar"). Assim, o CD veio para chutar a bunda do vinil, o mp3 chegou descendo o sarrafo no CD, o, sei lá, torrent? (Netflix?) surgiu jogando as dez pragas nas locadoras e cinema e, finalmente, Kindles e iPads aterrisaram no mundo para acabarem com os livros.
É claro que a convivência pacífica entre tecnologias atuais e passadas é algo fora de cogitação, uma aberração inominável que jamais passaria pela cabeça de qualquer pessoa decente, qualquer pessoa de bem, que tenha uma família respeitável e um emprego digno (oito às dezoito). Quem cogita essa possibilidade são apenas os retrógrados, presos no passado por alguma loucura e inevitavelmente, cedo ou tarde, deixados à própria sorte por não se adaptarem. A lógica deles é complexa, os verbos deles conflitam com o nosso - o progresso acontece para que a gente possa usar ele, não refletir sobre ele.
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