Dia desses, como de costume, eu estava saindo do prédio onde trabalho para, como não de costume ultimamente, pegar um ônibus. Entretanto, como de costume toda vez que eu pego ônibus, ao atravessar aquele redemoinho de vidro e metal que batizaram de "porta giratória" vi o ônibus imediatamente deixando a parada para onde eu me dirigia. Um rápido cálculo entre a distância da próxima parada, a minha sofrível capacidade atlética e a incrível habilidade que o trânsito de Porto Alegre tem de jogar na retranca e fechar todos os espaços levou à conclusão de que sim, havia tempo de sobra para realizar tal plano insano. Assim, sem mais nem menos, disparei na correria desenfreada, carregando ainda nas costas uma mochila e uns bons sete ou oito meses desde que dei um pique assim.
A hora do rush porto-alegrense cumpriu seu papel, impedindo o ônibus de andar sequer 10 metros sem queimar uma Guerra no Iraque de combustível graças ao "arranca-e-para" (que eu carinhosamente chamo de "seleção holandesa"). Isso permitiu a minha triunfante chegada na parada com tempo de sobra, com direito à música-tema de "Rocky" tocando (na minha cabeça). Eu gostaria muito de dizer que todas as pessoas no local se levantaram (mesmo as que já estavam de pé) e aplaudiram e houve uma câmera fazendo um travelling circular naquele momento, mas a única reação ali foi aquele leve aceno de cabeça de solidariedade resignada (vocês sabem, quando a pessoa faz um quase-sorriso e franze a sobrancelha para tentar expressar algo do tipo "já passei por essa situação e entendo, mas não a um nível que me faça querer conversar ou fazer algo a respeito disso").
O que me surpreendeu, entretanto, foi que eu não estava ofegante. Apesar do longo período sem atividades físicas que se estendessem além do raio entre o sofá e a TV, cheguei bem à parada. Um pouco cansado, claro, mas nada além do normal. Foi uma corrida legal, e eu estava ali, inteiro, pronto para encarar a orgia de um ônibus lotado. Talvez o tempo não chegue na gente com tanta rapidez assim.
Daí fui subir no ônibus e percebi que meu joelho esquerdo, que até então havia ficado sempre na dele, iniciou um protesto enviando sinais nervosos ao cérebro que, sacana do jeito que é, os interpretou como "dor". Uma dor que dura até hoje, e que provavelmente vai ter que me levar ao médico, e que provavelmente vai resultar em algum tratamento.
Somando isso ao fato de que muitos amigos meus de idade semelhante já passaram pelos mais diversos apuros envolvendo a mesma região do corpo, inclusive com dois ou três deles rompendo os ligamentos, chego à única conclusão possível: a questão sobre a vida não é que o tempo vem e te deixa de joelhos; é que o tempo vem e te deixa sem joelhos.
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