"Dizem que ninjas são capazes de atravessar paredes e portas. Como posso ensinar este truque para meu cachorro, e assim não precisar mais levá-lo pra rua toda hora?", é a pergunta que o Ninja responde em tom de alerta: "Cuidado, meu amigo! Uma vez que um cachorro aprende um truque ninja, ele deixa de ser o melhor amigo do homem!". E acrescenta: "Ninjas Caninos, ou melhor - Caninjas - são coisa séria!". Esta e mais de 40 outras perguntas absurdas sobre o universo ninja são ninjamente respondidas em Ask a Ninja, uma série de videos de grande sucesso no YouTube e também um ótimo exemplo de exploração de direitos autorais na internet - totalmente a favor da maré.
"Ninjas são capazes de amar?" "É claro que são! Mas eles amam de modo fatal!". Assim como acontece no Dilbert e nos Malvados, onde uma boa idéia e um bom texto sustentam a má qualidade dos desenhos, Ask a Ninja é um sucesso porque tem no roteiro seu grande trunfo: é criativo, inteligente e original - qualidades que compensam a tosquera da produção totalmente caseira e barata de Kent Nichols e Douglas Sarine - os criadores, produtores, diretores, editores e distribuidores de Ask a Ninja.
Uma das 3 forças da Cauda Longa, a democratização dos meios de produção (tecnologia barata para produzir e editar videos em casa) e distribuição (banda larga difundida) permite a quase qualquer pessoa criar sua própria série e veiculá-la de graça na internet. Se a idéia for boa, o sucesso virá mais cedo ou mais tarde. No caso de Kent Nichols e Douglas Sarine veio em dezembro de 2005, quando foi postado no YouTube o primeiro episódio da série, "Ninja Mart-Store", com a pergunta sobre onde ninjas compram roupas e acessórios ninjas. Apesar de ser um dos episódios mais chatos, muita gente assitiu, gostou e pediu mais. Ou melhor: fizeram mais perguntas ao Ninja.
Aí está outro trunfo da série: saber explorar a internet e o YouTube. O Ninja responde perguntas enviadas por e-mail em videos curtos (3 minutos de duração, em média) e os criadores verificam o sucesso do episódio de acordo com os comentários gerados no YouTube, que também fornece estatísticas sobre quanta pessoas assistiram, quantas postagens foram feitas em blogs, quantos adicionaram aos favoritos, e assim por diante.
"Os ninjas celebram o Natal?" "Mas é claro! Veja, Papai Noel é na verdade um grande ninja! Sua roupa é vermelha de sangue de crianças que ele mata quando tentam encontrá-lo! E não existem anões e elfos. O que há, na verdade, são um monte de pequenos ninjas!" Em março de 2006, já no 13º episódio e com muito sucesso, os criadores de Ask a Ninja passaram a investir em merchandising: no final de cada episódios o Ninja convida o público a comprar coisas ninjas no site official, como camisetas, bonés, DVDs e até ringtones para celular com a música de abertura (que é bem irritante, por sinal, mas deve vender bastante). Recentemente a série ganhou patrocínio do Ask.com, o 3º maior site de busca do mundo (o nome Ask caiu ninjamente como luvas), e está previsto para 2008 o lançamento do primeiro livro, "Guia para não-ninjas tornarem-se mais ninjas". Massa!
Mas o que mais me chama a atenção em Ask a Ninja é que não há tanto espaço para violação de direitos autorais ou pirataria: a série surgiu na internet e se vale exclusivamente dela para continuar existindo. Kent Nichols e Douglas Sarine são exemplos dos novos profissionais de entretenimento que podem surgir por aí: eles não precisam passar por testes televisivos, fazer cursos de teatro, comparecer a audições, nada. A internet atravessa esta barreira (ou seria um funil?) e ainda deixa os direitos autorais nas suas mãos, podendo escolher entre "fechar um contrato e vender uma idéia boa para um canal de televisão" ou "desenvolver uma idéia apenas através da internet sem dividir ou abrir mão dos direitos".
Agora que o Brasil ganhou uma versão em português do YouTube, será que teremos séries brasileiras fazendo sucesso por lá também? Provavelmente muito lixo vai aparecer quando se abre um espaço como este (ainda mais para brasileiros) mas, no meio da multidão, Ask a Ninja conseguiu se destacar, ganhar um público, tornar-se rentável e viver da internet. É um caso , enfim, onde a interatividade do meio foi levada em consideração e o "uma câmera na mão, uma idéia na cabeça e uma merda de video" não prevaleceu.