Direção: Marc Foster
Roteiro: Zach Helm
Elenco:
Will Ferrell (Harold Crick)
Denise Hughes (Carla)
Tony Hale (Dave)
Maggie Gyllenhaal (Ana Pascal)
Emma Thompson (Kay Eiffel)
Queen Latifah (Penny Escher)
Tom Hulce (Dr. Cayly)
Linda Hunt (Dr. Mittag-Leffler)
Dustin Hoffman (Prof. Jules Hilbert)
Será que aquela voz que eu sempre ouvi dizendo "Vai lá e chuta esse gato, não vai dar nada!" não era loucura?
Harold Crick é um funcionário da receita federal, um cara metódico² que conta as escovadas de dente de manhã, os passos até o ônibus, o tempo do trajeto... enfim, uma pessoa como qualquer outra. Até que, certo dia, ele começa a ouvir uma voz que narra não apenas seus atos, mas também suas idéias. Como ninguém mais parece ouvir, ele começa a investigar tal acontecimento com a ajuda de um professor de literatura, sendo apressado quando a voz diz que ele pode morrer subitamente. Começa então uma corrida para descobrir quem é a escritora que está narrando e se ela realmente pretende matá-lo.
Convenhamos: a premissa é ducaralho. No entanto, vários filmes que tinham ótimas premissas acabaram em fiasco. Portanto, a primeira decisão acertada do filme é não tentar explicar 'cientificamente' o porquê de Harold ouvir a voz. Não há palavras mágicas, biscoitos da sorte, maldições, profecias ou aranhas radioativas. A coisa simplesmete acontece. Ponto.
A partir daí, o diretor Marc Foster, apoiado pelo excelente roteiro de Zack Helm (do também sensacional O Sol de Cada Manhã), conta a história de um homem que é obrigado a mudar seus hábitos para conseguir ter uma idéia do que está acontecendo. Eu sei, parece batido. Mas o filme todo é permeado por uma atmosfera tranquila, ganhando tensão apenas no final. Ou seja, a trama flui. De forma impressionante. Auxiliado por recursos visuais extremamente criativos, conseguimos mergulhar no mundo daquele homem, acreditanto junto com ele que essa situação improvável é real.
E aqui devo dizer que nada disso iria adiantar se não fosse por Will Ferrell. Longe do histrionismo e exagero habitual, ele nos brinda com uma atuação minimalista e cativante, fazendo com que realmente possamos nos importar com Harold Crick, rir de suas trapalhadas e temer pelo seu destino. Através de uma química perfeita com as outras personagens (principalmente a confeiteira interpretada por Maggie Gyllenhaal e o fantástico professor a quem Dustin Hoffman dá vida), constroem-se ali verdadeiros laços de relacionamento, tornando assim a história mais densa e passível de identificação por parte do espectador.
Chegamos, então, ao único ponto que incomoda um pouco: o final. Desde o início, tive medo que o roteiro não conseguisse amarrar as pontas de forma convincente, como acontece com outros; no entanto, o filme segue sempre para um desfecho coerente - e, se eu digo que ele incomoda um pouco, é apenas porque a decisão dos autores foi torná-lo um final feliz, que constrasta um pouco com a lógica e com a leve melancolia que volta e meia dá as caras.
Mas a história toda é tão bem construída, tão bem conduzida que quando chega o final, apesar de pensarmos que essa escolha não é exatamente a correta, sentimos uma sensação de alívio pelas personagens. Porque, no final das contas, somos exatamente como eles: um pouco diferentes, um pouco malucos, só tentando sobreviver.