Navegando pelos mares bacanas do The Frontal Cortex, do ótimo Jonah Lehrer (já falei sobre um livro dele aqui no Cataclisma), me deparo com este post, onde ele discorre sobre como grandes sistemas não podem ser analisados ou definidos com equações ou telescópios. Peço licença para traduzir livremente um parágrafo que enche meus olhos de lágrimas:
Karl Popper, o grande filósofo da ciência, uma vez dividiu o mundo em duas categorias: relógios e nuvens. Relógios são diretos, sistemas ordenais que podem ser resolvidos através de redução; nuvens são uma bagunça epistêmica, "altamente irregulares, desordenadas, e, na maior parte das vezes, imprevisíveis". O erro da ciência moderna é achar que tudo é um relógio, e é por isso que somos seduzidos de novo e de novo pelas falsas promessas de scanners cerebrais e sequenciadores de genes. Queremos acreditar que vamos entender a natureza se encontrarmos a ferramenta exata para cortar suas articulações. Mas essa abordagem está destinada a falhar. Não vivemos em um universo de relógios, mas sim de nuvens.
De uns tempos pra cá, a humanidade desenvolveu um fetiche devastador por números. Centímetros, metros, calorias, datas, euros, dólares, reais, porcentagem de erros, de acertos, dados, proporções. É como se um número pudesse, por si só, justificar uma verdade. Estamos querendo decidir as coisas através deles, como se um argumento ou opinião muito bem elaborados empalidecessem frente a um totalitário conjunto de dois e cincos, quatros e zeros ou qualquer coisa assim. Porque daí não há mais a dúvida, não há mais a dubiedade, não há mais a discussão, não há mais a derrota.
Mas os números não enxergam tudo: este nosso universo está repleto de nuvens. Ter 102 cm de quadril e 70 cm de cintura não torna uma mulher bonita ou feia; faturar 900 milhões de dólares mundo afora não torna um filme bom ou ruim; analisar as estatísticas de um jogador de futebol não é o suficiente pra saber se ele joga bem ou não.
Porque nem tudo pode ser quantificado, assim como, acredito, tantas outras coisas não podem ser qualificadas. Não a toa Douglas Adams usou o "42" como resposta para a "questão da vida, do universo e de tudo mais": o inglês nonsense estava zombeteiramente jogando na nossa cara a nossa crença de que há uma resposta certa e absoluta, indiscutível, tão certeira e definidora quanto apenas um número pode ser.
E como sempre, Calvin e Haroldo ilustram a discussão de forma muito mais profunda, clara e estilosa do que eu:
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