Kurt Cobain (Narrador)
Uma tentativa de captar a figura do líder do Nirvana, aproveitando material das vinte e cinco horas de gravação de uma entrevista que ele fez com o jornalista Michel Azerrad.
Ao longo dos noventa e seis minutos de documentário, imagens de Kurt Cobain e do Nirvana devem aparecer por, no máximo, dez ou vinte segundos. Seja por escolhas dos autores, ou porque Courtney Love mantém os direitos sobre imagens e músicas da banda trancafiados, o filme é praticamente todo composto por cenas que não possuem nenhuma ligação direta com o assunto. Como um grande videoclipe - só que, ao invés de apenas canções, temos como guia uma narração em off do próprio Cobain.
E, ainda que não seja um documentário "tradicional", o diretor consegue manter uma linearidade na edição do áudio. Kurt Cobain começa falando de sua vida na pequena Aberdeen, passando pela vida de BOÊMIO (leia-se "vagabundo") em Olympia e finalmente a mudança pra famosa Seattle. À medida que a conversa vai se desenrolando, muitas vezes contando com intervenções do próprio jornalista, o diretor, com sucesso, busca imagens que de certa forma tenham o mesmo tom do momento (quando Cobain fala de mudanças de cidade, por exemplo, é comum ver sequências de carros em movimento ou paisagens sendo deixadas pra trás). Isso tudo cria uma atmosfera quase poética, ainda mais com a trilha sonora escolhida a dedo, que inclui bandas como Queen, Creedence, Stooges e por aí vai.
A informação se concentra toda nos depoimentos de Kurt Cobain. E enquanto ele discorre sobre seus sonhos, suas opiniões, seus medos, seus traumas, o espectador vai conhecendo um pouco daquela figura mítica que foi embora tão rápido quanto surgiu. Não há assuntos proibidos, e as discussões passam tanto pela banda e seus integrantes como pela relação dele com sua esposa. Pessoalmente, senti falta de uma aproximação maior quanto à criação e o lançamento do disco Nevermind, de longe o mais importante da banda - talvez tenha sido uma restrição do próprio músico, mas ainda assim deixa um certo vácuo na história.
O Nirvana apareceu meteoricamente em uma era pré-internet. Não havia muito o que descobrir a respeito da banda, a não ser suas músicas, em discos que marcaram a história da cultura pop. Kurt Cobain: Retrato de uma Ausência não vai resolver nenhum mistério, apenas enquadrar um pouco mais de perto a imagem do líder do Nirvana. Torná-lo menos mítico e mais humano. E, nesse processo, quem sabe o próprio espectador não possa fazer da experiência toda uma espécie de reflexão sobre si mesmo.