Tá legal, já adiei por muito tempo: o disco saiu no dia primeiro de maio, e um mês depois eu comprei. O artifício "Não tenho tempo pra escrever sobre mais nada durante a Copa" foi bastante utilizado, mas o torneio acabou e infelizmente os tchecos não levaram a taça. Depois de combater a preguiça com unhas e dentes e perder centenas de vezes, resolvi finalmente colocar esse post que tá encalhado na minha cabeça há uns dois meses.
Estou empolgado ao escrever estas palavras. Muito empolgado. O novo disco do Pearl Jam, auto-intitulado, é um oásis de criatividade no meio dessa recauchutagem feita pelas bandas vintage, assim como foi o do Oasis (sem trocadilhos) em 2005 e o do U2 em 2004. O Neil Young lançou um belíssimo trabalho este ano também, mas é claro que ele não recebe tanta atenção na mídia quanto, digamos, o White Stripes.
Sobre o Pearl Jam, então. O que se lê na "mídia especializada" é uma "volta da banda aos bons tempos", uma retomada de raízes (situação pela qual o U2 também passou ao lançar o "All That You Can't Leave Behind", em 2000). Mas isso é besteira. Esqueçam toda essa baboseira, por dois motivos. Primeiro: foi em sua "fase ruim" que o Pearl Jam lançou seus dois melhores discos, No Code e Yield (este a obra-prima da década de 90). Segundo: o novo "Pearl Jam" não é nada mais do que uma evolução do excelente Riot Act (2002), último álbum de estúdio que a banda havia lançado. Por isso, o novo trabalho traz menos experimentações, músicas mais diretas, sem deixar de lado a inspiração que permeou toda a carreira deles. Um disco político, que chega em um momento controverso e complicado, incitando não apenas uma "revolta contra o Bush", como muitas revistas falam por aí, mas sim uma reflexão sobre o que anda acontecendo. Não é a toa que o disco não tem nome: é muita informação para ser resumida em um título. E quem disse isso nem fui eu. Foi o Bob Dylan.
1 - Life Wasted Melodia: Gossard Letra: Vedder
Mazá, o disco já abre com uma pérola. Uma canção rápida, envolvente, com um excepcional trabalho de guitarras e um linha vocal primorosa. "Eu provei/Uma vida desperdiçada/E nunca mais vou voltar" canta o vocalista no refrão, em uma música que reflete bem o que a banda passou ao longo da carreira.
2 - World Wide Suicide Melodia e Letra: Vedder
Música que valeria o nome só pelo título. Para muitos é sobre a invasão ao Iraque, mas pode ser aplicada em qualquer lugar do mundo (É uma vergonha acordar em um mundo de dor/O que significa quando uma guerra tomou conta?). Não é a toa que foi o primeiro single: além de sua óbvia qualidade radiofônica, é agitada, possui uma urgência que casa perfeitamente com o tema proposto. Nada de revoltas óbvias. Refletir é tudo.
3 - Comatose Melodia: Gossard e McCready Letra: Vedder
Mais uma paulada do Pearl Jam, no melhor estilo "Brain of J". As guitarras furiosas dão o tom, enquanto Vedder solta um vocal rasgado e intenso. Descrevendo assim pode parecer uma típica música punk, mas a banda de seattle consegue ser criativa e criar uma canção memorável.
4 - Severed Hand Melodia e Letra: Vedder
Essa eu achei mais ou menos. A parte instrumental é realmente muito interessante, mas o vocal tenta parecer "estranho" demais, ao invés de se ater à melodia. Soou como uma tentativa de reeditar "Insignificance" (Binaural, 2000). O finalzinho até empolga bastante (E se eu não perder o controle?/Explorar ao invés de explodir), mas aí já não adianta.
5 - Marker In The Sand Melodia: McCready Letra: Vedder
Mais uma vez McCready e suas afinações alternativas constroem uma canção brilhante, que já nasceu clássica. Um riff quebrado leva a música enquanto Vedder questiona a fé cega (Agora temos os dois lados/Matando em nome de Deus/Mas Deus não pode ser encontrado em nenhum lugar, convenientemente). Poderia ser mais pertinente? Atenção: o refrão de "Marker In The Sand" é absolutamente, indescritivelmente espetacular, e ele VAI ficar na cabeça de quem ouvir durante dias. Quem avisa amigo é.
6 - Parachutes Melodia: Gossard Letra: Vedder
Uma balada acústica. Pode soar um pouco estranha nas primeira audições, não é uma balada convencional - lembra bastante até John Lennon em sua fase solo. No entanto, e não sei dizer exatamente porque, acho ela de uma qualidade excepcional, posso ouvir duas, três, quatro vezes seguidas. Tenho um carinho muito grande por essa canção. Stone estava inspirado.
7 - Unemployable Melodia: McCready e Cameron Letra: Vedder
Uma das poucas músicas pearjanianas onde a batida quebrada de Matt Cameron funciona. Me lembra "Dissident", embora uma não tenha nada a ver com a outra. Possui uma melodia muito boa, com versos inspirados em cima - Eddie Vedder soa como Bruce Springsteen, cantando uma história comum na terceira pessoa para denunciar um problema maior (e universal). Uma canção legal, com grande potencial radiofônico.
8 - Big Wave Melodia: Ament Letra: Vedder
Rockzão no estilo que o Jeff vinha fazendo. Rápida, diferente e inspirada, possui um refrão grandioso, que volta de novo aos riffs potentes do verso em um círculo cativante. É de uma simplicidade admirável. Tipo de música que, tocada no início ou no final do show, vai fazer a gurizada se arrebentar na platéia.
9 - Gone Melodia e Letra: Vedder
Música que começa lenta, vai crescendo aos poucos e explode em um refrão apoteótico. Mas sou suspeito pra falar: fico arrepiado sempre que a ouço.
10 - Wasted Reprise Melodia: Gossard Letra: Vedder
A repetição do refrão de "Life Wasted", apenas com a voz e um teclado atrás dando o clima. Uma ótima idéia, melhor que aquelas "estranhezas" que o Pearl Jam costuma colocar nos discos.
11 - Army Reserve Melodia: Ament Letra: Vedder e D.Echols
Fraquinha. Não é uma música ruim, mas também não é grande coisa. Tem até uma levada bacana, e a idéia é bem legal ("Army Reserve", ou "Reservista do Exército", não se refere aos reservistas em sí, mas sim às famílias dos soldados). Não me chamou muito a atenção.
12 - Come Back Melodia: Vedder e McCready Letra: Vedder
Melhor pegar uma caixa de lenços de papel antes de ouvir essa. Uma balada sobre alguém que já se foi. Simples, cativante e sincera ao extremo, é permeada por um clima de grandiosidade e sofrimento. Se o início já é amargurado (Se eu continuar aguentando/A luz conseguirá me alcançar?), ser levado pela música até o refrão (E nas noites eu espero por/Uma possibilidade de que possa te encontrar nos meus sonhos/Algumas vezes você está lá e está falando comigo/Chega de manhã e eu posso jurar que você está ao meu lado), o belíssimo solo de guitarra e o final com Vedder gritando desesperado (Eu estarei aqui/Volte/Volte) é uma experiência única.
13 - Inside Job Melodia: Vedder e McCready Letra: McCready
Última música do disco, que faz referência à Doença de Chron, da qual o guitarrista Mike McCready sofre. Começando com uma atmosfera sombria, floydiana, a canção vai ganhando força. Conforme o resto da banda entra, ela fica grandiosa, levemente otimista. A melodia é sensacional, e prova mais uma vez que o Pearl Jam é uma das (senão A) bandas mais criativas da atualidade. Sem soar datado, repetitivo ou cover de si mesmo, fizeram uma canção soberba, que aos poucos vai mudando o humor de quem estiver ouvindo. Mais uma pérola, assim como muitas neste disco, que considero mais uma obra-prima da minha banda favorita. E depois do clima "pessmista" do álbum (o mais político que o Pearl Jam já fez), do início meio melancólico da canção, a última frase deste trabalho - envolta no mais cativante clima de otimismo - é arrebatadora:
"A vida vem de dentro do teu coração e dos teus desejos". |