Uma adaptação de outra obra ou evento histórico não precisa ser 100% fiel. Quando o roteirista Frank Miller fez a graphic novelintitulada 300 de Esparta, então, ele colocou os fatos de forma a construir uma narrativa épica, com personagens memoráveis e, mais importante, onde o leitor se identificasse e torcesse pelos protagonistas - no caso, os espartanos. No momento em que hollywood se propôs a adaptar o GIBI, não pude deixar de correr pela casa fazendo aviãozinho, pois a coisa não pode ficar mais heróica do que isso. As primeiras imagens foram de tirar o fôlego, e tudo indicava um filmaço. Então saiu o primeiro trailer, que coloco abaixo numa versão toscamente legendada porque foi a única que achei:
Foi quando uma matilha de avisos estalou na minha cabeça. Ok, é um filme supostamente épico e tal, mas por que tanta câmera lenta? E qual é a moral daquela trilha METAL em um filme que devia ser emocionante? E por que a voz do narrador parece mofada? E por que Leônidas grita desesperadamente o tempo todo, como um goleiro que tem à sua frente uma zaga ruim? E por que ele precisa a aprovação da mina pra chutar o cara pro poço? Eles não eram os machos transbordando de testosterona e tal? E por que o Abominável, inimigo do Hulk, luta pelos persas? E quem é aquele gordão com as espadas no lugar de braços? E como diabos esse gordão faz pra comer?
Ignorei todos. A história prometia, as imagens ainda eram incríveis, e o diretor Zack Snyder teria que fazer um pacto com o diabo pra transformar aquilo num filme ruim. Mas, mostrando que o ser humano sempre se supera, ele conseguiu. E, o pior de tudo, foi aplaudido por isso.
Os anos passaram e Zack Snyder, provando ser mesmo o anticristo, resolveu adaptar Watchmen, a mais comentada e famosa das graphic novels. Nessa maxisérie em doze edições, o roteirista Alan Moore pegou um grupo de super-heróis bobinhos e os atirou em um mundo real, onde as ações dos mascarados possuem consequências (os EUA vencem o vietnã; greve da polícia; protesto por parte dos cidadãos; caça aos encapuzados). Utilizando flashbacks, antecipações, ironia e uma estrutura original (incluindo uma história dentro da história), Watchmen constrói um mundo plausível, onde os heróis enfrentam dilemas éticos e psicológicos. Não vou me aprofundar muito, mas já dá pra perceber que a narrativa da coisa é mais centrada em diálogos e decisões do que em cenas de ação, certo?
Bom, começaram a pipocar imagens da adaptação, joguinhos de marketing e tal, até o surgimento do inevitável trailer:
E, novamente, certas questões surgem na minha cabeça: por que, afinal, o uso exagerado da PORRA DA CÂMERA LENTA, um recurso eficiente mas que perde a força quando utilizado de forma excessiva? E por que as cenas de ação com o FF / REW do videocassete, sem nenhum motivo para isso a não ser o "vejam, fiz cenas de ação estilosas, eu quero ser matrix!"? E por que a tentativa de transformar Rorscharch no mocinho da trama durante o trailer, se no final o cara se contradiz com aquele "o mundo vai olhar para cima e gritar 'salve-nos', e eu vou dizer 'não'"? E por que a trilha épica e focar nas cenas de ação, quando elas são auxiliares na trama original?
Não, dessa vez não dou crédito. Watchmen, a adaptação, estréia sexta, e eu com certeza vou conferir, e com certeza vou assistir compreendendo que, por mais fiel que seja, existem coisas que precisam mudar na transição das páginas pra telona. Mas já deixo meu palpite aqui: o filme vai ser mais desastroso do que ver Orteman no time titular do Grêmio. Aliás, qualquer coisa que coloque no seu material de publicidade a frase "do visionário (sic) diretor de 300" não merece ser levada a sério.